Uma lei inconstitucional

Olá, para todos vocês!! Por diversas vezes já foi dito nesse espaço que o leitor não brilhe os olhos comparando o ordenamento jurídico americano e inglês ao nosso brasileiro. Lá funciona diferentemente daqui. Simples assim! Até mesmo o controle de constitucionalidade não é igual. Para o pessoal acadêmico o papo de hoje será um deleite, para o público geral mais um momento de aumentar o conhecimento sobre essa área tão nobre, essa ciência cativante, esse mundo que fascina dia sim e dia também… o Direito! Pega lá na geladeira uma garrafa com água beeeem gelada, sente aí na poltrona, desligue a TV e siga na leitura.

O caso de hoje versa sobre a Tese de Repercussão Geral (RE nº 833.291) em que o STF disse que “São inconstitucionais leis municipais que obriguem shopping centers a implantar ambulatório médico ou serviço de pronto-socorro equipado para o atendimento de emergência.”. Olha que tema mais legal para um debate neste dia!! Tudo começou lá nos idos dos anos 90 quando municípios começaram a legislar (indevidamente, diga-se) sobre essa questão. Especificamente em São Paulo, com sua Lei nº 10.947/1991 com a seguinte ementa “Impõe a exigência de instalação de ambulatório médico ou serviço de pronto-socorro nas edificações destinadas a abrigar “shopping-centers”, e dá outras providências.”, além de sua regulamentação dada pelo Decreto nº 29.728/1991 com alteração posterior nesse mesmo diploma legal com a Lei nº 11.649/1994. O ponto crucial aqui é tentar entender como que leis como essas passaram pelo crivo de comissões e do plenário da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP) bem como a própria Prefeitura local não vetou essa insanidade à época. Quem possuir teses que possam responder a essa tresloucada jabuticaba, pode mandar para este advogado que será uma alegria ler todas elas.

Aí veio a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) que, obviamente, quando se deparou com essa obrigação, colocou na ponta do lápis os custos envolvidos em cumprir essa decisão do município paulistano. Como a vida não é um chocolate gelado que se toma em casa de manhã antes de ir para a escola/trabalho, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) se manifestou argumentando que o Estado apenas estava a cumprir um de seus papeis, isto é, o de poder de polícia. Maluquice, não é mesmo?! O argumento ainda veio recheado de “(…) preservar a integridade física e a saúde dos frequentadores e usuários dos shoppings.”. Ato contínuo, a Abrasce não se conformou e levou o caso adiante e como o controle de constitucionalidade passa pelo STF (existe o controle concentrado e o difuso, falaremos sobre cada um deles em dias futuros) a Corte se manifestou. O relator do caso foi o Min. Dias Tóffoli “As imposições contidas nas leis impugnadas afrontam, desproporcionalmente, a liberdade econômica, consistindo em inadequada e impertinente intervenção estatal!”. Com esse voto – que foi acompanhado por outros ministros – a tese dita anteriormente ganhou vida.

Mas Dr. Rodrigo, teve voto divergente? Teve sim, meu atento leitor. Considere que quatro ministros entenderam pela constitucionalidade das leis. Quem votou pela inconstitucionalidade argumentou que as matérias eram de Direito do Trabalho e Direito Comercial e, portanto, privativas da União legislar além de ferir o Princípio da Livre Iniciativa (art. 170, da Constituição). Para os que votaram favoráveis pela constitucionalidade tratava-se de Direito do Consumidor onde municípios podem legislar. Vamos concordar, esse mundo jurídico é apaixonante demais!! O min. Edson Fachin – que votou pela constitucionalidade – disse em seu voto que “A proteção ao consumidor, em sentido mais amplo, está em sintonia com a proteção à livre iniciativa e à ordem econômica, resguardando o direito fundamental da propriedade e de sua função social, no modelo de Estado social e democrático de Direito!”.

Portanto, o convite é de que o leitor averigue como estão as leis propostas nas assembleias legislativas municipais e na Câmara Legislativa do DF. Você sabia que, de acordo com o Anuário da Justiça do Brasil em 2022, o ranking de traquinas legislando indevidamente possui como Top 5 a União em primeiro lugar seguida do Rio de Janeiro; Paraíba; São Paulo e Rondônia? Houve um aumento da ordem de 75% considerando 2021/2022. E a conta para essa má prestação de serviço todos nós pagamos, certo?! Por fim, lembre-se de estar atento sempre e que em 2024 o (e)leitor faça valer muito bem sua escolha de parlamentares e prefeitos em suas cidades. Atenção sempre!