O calor, a água e o justo papel do Estado

Olá, para todos vocês!! Pela segunda oportunidade desde que cheguei neste espaço o líquido que traz à vida é tema. Não bastasse o calor inimaginável a que estamos sofrendo todos, também estamos diante de uma nova formatação de relação de consumo onde o Estado atuou instantaneamente (infelizmente após uma morte evitável). A água continua sendo o grande mantenedor da sobrevivência de todo ser vivo, porém, o Estado deve de fato intervir na economia? Até onde a política pública deve suprimir o livre mercado? E os direitos nessa questão toda ficam como? Vamos lá!

O Ministério da Justiça e Segurança Pública em parceria com a Secretaria Nacional do Consumidor, após fato lamentável ocorrido com uma pessoa que faleceu no show de Taylor Swift, expediu a Portaria GAB-SENACON/MJSP nº 35 em 18 de novembro. Em sua ementa está expresso que “Estabelece estratégias destinadas à proteção da saúde dos consumidores em shows, festivais e qualquer outros eventos de grandes proporções e dá outras providências.”. Mas Dr. Rodrigo, o que são essas grandes proporções? Caro leitor,  não há, acredite, menção a essa parte na Portaria citada. É uma lacuna que passou e deixou vazio para interpretações diversas e distintas. Essa questão nos remete a estudarmos mais o nosso ilustre Código de Defesa do Consumidor.

O CDC em seu art. 39, V, veda a obtenção de vantagem manifestadamente excessiva a que as empresas (fornecedoras de produtos ou serviços) se valem ao cobrar valores absurdos em produtos dentro de seus espaços. Recebi relato de um amigo que a garrafa com água – essa de 500 ml estava ao valor de R$ 15,00 a unidade dentro do local do show de Taylor. S-u-r-r-e-a-l!! Ainda no CDC temos o art. 106, II, que versa sobre o sistema nacional de defesa do consumidor especificamente ao que diz respeito a receber, analisar, avaliar e encaminhar consultas, denúncias ou sugestões apresentadas por entidades representativas ou pessoas jurídicas de direito público ou privado. E teve denúncia Dr. Rodrigo? Teve sim e muitas inclusive. A deputada Erika Hilton assim o fez, chamando a Procuradoria Federal dos Direitos dos Cidadãos do Ministério Público Federal, a apurar a conduta da empresa responsável pela The Eras Tour de Taylor Swift. A representação de Hilton diz, entre outras partes, que “A venda de água nessa situação, além de cruel, torna-se também um pesadelo logístico para seu fornecimento, impedindo que o público acesse o que há de mais básico com facilidade e colocando-o em situação de risco. A saúde das pessoas não é mercadoria. E as empresas que atentam contra ela precisam ser responsabilizadas.”.

Além disso também teve manifestação da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro que ajuizou ação com pedido liminar para que a T4Fun seja obrigada a fornecer água para todos os participantes/espectadores dos shows de Taylor Swift. Acrescentou ao pedido que a empresa não impeça o livre acesso do público com suas próprias garrafas com água. Quem assina o pedido é o Nudecon – Núcleo de Defesa do Consumidor da DP/RJ. Na petição inicial há citação expressa da Lei nº 2.424/1995 que no seu art. 1º diz “Os bares, restaurantes e estabelecimentos similares ficam obrigados a servirem água filtrada, de forma gratuita, aos seus clientes.”. Assim disse o coordenador do Nudecon “A água é um bem primário, sem o qual a pessoa não pode viver. Impedir a entrada de milhares de consumidores com suas garrafas de água, em uma situação de calor extremo, para a simples finalidade de lucrar mais com a venda de água, é uma conduta ilícita e que deve ser combatida por todos os órgãos públicos.”.

Por fim, meu estimado e calorento leitor e leitora, a água é direito de todos e não deve ser utilizada como fonte inesgotável de acúmulo de riqueza servindo a sua existência para vendas com valores estratosféricos. Lembremos que há a Declaração Universal dos Direitos da Água, documento redigido pela ONU em 22 de março de 1992. Sê, portanto, absolutamente crítico em relação ao seu bom uso. O Estado deve, sob a ótica deste advogado, intervir sempre que o bem-estar coletivo, que a paz social sofrer ou estiver na iminência de sofrer abalos consideráveis em nome do lucro injustificável e da conduta virulenta. Á água é direito de todos… Pense nisso!!