O pato, as cadeiras e uma treta jurídica

Olá, para todos vocês!! Primeiramente aos que desejam rir, saibam que há toda a liberdade para isso. Afinal, como não achar piada de uma situação em que um sujeito foi preso ao (pasme caro leitor!) tentar subtrair 1 pato e 4 cadeiras. Em tempos de crimes virtuais, cyberbullying, criptomoedas, Drex, PIX… algo assim ainda acontecer é risível. Mas, vamos lá ao que interessa a todos que leem essa coluna: tretas jurídicas e como elas acontecem e podem ser resolvidas com um toque clássico de incitações e pensamentos.

Pois bem, o caso do furto do pato e das cadeiras – que somados em valor de mercado alcançam a bagatela de R$ 230,00 – aconteceu lá em São Paulo. O sujeito teve sua denúncia recebida em 08 de janeiro de 2018 pelos crimes de Furto (art. 155, do Código Penal), porém, crime este tentando conforme art. 14, II, também do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940) que assim diz “II – tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.”. Mas, Dr. Rodrigo, qual foi a vontade alheia? Meu caro e curioso leitor, quando esse sujeito malandrinho estava quase indo embora com o fruto de sua ação foi flagrado pela Guarda Civil do município. Ah! E não somente ele, havia outros desmiolados nessa busca pelo pato (vai lá saber se ele não seria o jantar naquela noite!). A polícia então os abordou e aí entra outro crime cometido, ou seja, o sujeito principal mentiu sobre sua identidade… e isso é crime, pois, está previsto no art. 307, do supracitado Código Penal. A redação desse artigo é essa com a seguinte sanção “Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.”. Tudo por conta dum pato e quatro cadeiras, i-n-a-c-r-e-d-i-t-á-v-e-l!!!

Esse caso de hoje chegou ao Superior Tribunal de Justiça. Sim! Os seus, os meus, os nossos impostos estão a custear a utilização do judiciário (em instância superior) para julgar um crime cometido por uma pessoa onde o valor econômico dos bens foi de R$ 230,00. Ê, Brasil!!! Felizmente, a Min. Daniela Teixeira entendeu pela aplicação do Princípio da Insignificância. Nele, a ministra em sua decisão escreveu “Com relação à condenação pelo crime de tentativa de furto, entendo que se trata de hipótese de aplicação do princípio da insignificância, uma vez que a ofensa ao patrimônio é irrisória, já que os bens foram prontamente apreendidos, possibilitando o reestabelecimento da posse pela vítima, e estão presentes os demais requisitos exigidos pela jurisprudência. A jurisprudência dessa Corte já sedimentou entendimento no sentido de que a prática de crime de furto de coisa com valor abaixo de 10% do salário mínimo vigente é considerada conduta atípica, pois insignificante.”. Isso posto, questionei meu amigo Dr. Bruno Monteiro, especialista na área, para nos dizer o que pensa sobre esse fato. Assim ele disse “Temos que ressaltar que não somente o Princípio da Insignificância, mas outros estão atrelados aos requisitos para sua admissibilidade como, por exemplo, uma mínima ofensividade a lesão da conduta, uma inexpressividade do meio que foi atingido e ausência de violência entre outras questões. É importante ressaltar que esses princípios são barreiras para aplicação de certas condutas extremamente lesivas para o cidadão comum. Uma jovem de 19 anos, à época em 2005, empregada doméstica, foi condenada a 4 anos de prisão pelo furto de um pote de margarina no valor de R$ 3,50. Esse bem jurídico tutelado que o Estado, por meio do jus ativismo, vem tentando evitar que seja danificado, isto é, não o patrimônio em questão, mas sim o desenvolvimento da vida e da integridade humana e da condição da pessoa natural.”. Interessante, não é mesmo?!

Por fim, meu caro leitor, não vá pensando que só porque aquele saco de balinhas do supermercado está aberto que é permitido surrupiar algumas unidades ou mesmo colocar uma fruta no bolso e sair “de cara limpa”. O fato de ser insignificante e de pouca ou nenhuma reprovabilidade social não permite que aconteça a torto e a direito. Não é de bom tom ou mesmo sensato o fazer. Crime é crime seja o maior ou menor, de valores (dinheiro) ou produtos. Contudo, vale a pena ser mais severo quando a conduta criminosa é cometida por quem deveria zelar pela probidade e pelo bem comum. Onde quero chegar com isso? O-u-t-u-b-r-o está logo adiante, reflita sobre as pessoas que serão seus escolhidos como vereadores ou prefeitos e prefeitas. E para o caso de hoje é bom dizer que o sujeito foi absolvido. Já basta o tanto de gente presidiária nesse país, não é preciso mais um lá por tentar furtar um pato e quatro cadeiras.